Homilia do Papa Francisco no Domingo de Ramos
As aclamações da entrada em Jerusalém e a humilhação de Jesus. Os gritos
festosos e o encarniçamento feroz. Anualmente, este duplo mistério acompanha a
entrada na Semana Santa com os dois momentos caraterísticos desta celebração:
ao início, a procissão com os ramos de palmeira e de oliveira e, depois, a
leitura solene da narração da Paixão.
Deixemo-nos envolver nesta ação animada pelo Espírito Santo, para
obtermos o que se pede na oração: acompanhar com fé o caminho do nosso Salvador
e ter sempre presente o grande ensinamento da sua Paixão como modelo de vida e
de vitória contra o espírito do mal.
Jesus mostra-nos como enfrentar os momentos difíceis e as tentações mais
insidiosas, guardando no coração uma paz que não é isolamento, não é ficar
impassível nem fazer o super-homem, mas confiante abandono ao Pai e à sua
vontade de salvação, de vida, de misericórdia; e Jesus, em toda a sua missão,
viu-Se assaltado pela tentação de «fazer a sua obra», escolhendo Ele o modo e
desligando-Se da obediência ao Pai. Desde o início, na luta dos quarenta dias
no deserto, até ao fim, na Paixão, Jesus repele esta tentação com uma obediente
confiança no Pai.
E hoje, na sua entrada em Jerusalém, também nos mostra o caminho. Pois,
neste acontecimento, o maligno, o príncipe deste mundo, tinha uma carta para
jogar: a carta do triunfalismo, e o Senhor respondeu permanecendo fiel ao seu
caminho, o caminho da humildade.
O triunfalismo procura tornar a meta mais próxima por meio de atalhos,
falsos comprometimentos. Aposta na subida para o carro do vencedor. O
triunfalismo vive de gestos e palavras, que não passaram pelo cadinho da cruz;
alimenta-se da comparação com os outros, julgando-os sempre piores,
defeituosos, falhados… Uma forma subtil de triunfalismo é a mundanidade
espiritual, que é o maior perigo, a mais pérfida tentação que ameaça a Igreja
(Henri de Lubac). Jesus destruiu o triunfalismo com a sua Paixão.
Verdadeiramente o Senhor aceitou e alegrou-Se com a iniciativa do povo,
com os jovens que gritavam o seu nome, aclamando-O Rei e Messias. O seu coração
rejubilava ao ver o entusiasmo e a festa dos pobres de Israel, de tal maneira
que, aos fariseus que Lhe pediam para censurar os discípulos pelas suas
escandalosas aclamações, Jesus respondeu: «Se eles se calarem, gritarão as
pedras» (Lc 19, 40). Humildade não significa negar a realidade, e Jesus é
realmente o Messias, o Rei.
Mas, ao mesmo tempo o coração de Cristo encontra-se noutro caminho, no
caminho santo que só Ele e o Pai conhecem: aquele que vai da «condição divina»
à «condição de servo», o caminho da humilhação na obediência «até à morte e
morte de cruz» (Flp 2, 6-8). Ele sabe que, para chegar ao verdadeiro triunfo,
deve dar espaço a Deus; e, para dar espaço a Deus, só há um modo: o
despojamento, o esvaziamento de si mesmo. Calar, rezar, humilhar-se. Com a
cruz, não se pode negociar: abraça-se ou recusa-se. E, com a sua humilhação,
Jesus quis abrir-nos o caminho da fé e preceder-nos nele.
Atrás d’Ele, a primeira que o percorreu foi a sua Mãe, Maria, a primeira
discípula. A Virgem e os santos tiveram que padecer para caminhar na fé e na vontade
de Deus. No meio dos acontecimentos duros e dolorosos da vida, responder com a
fé custa «um particular aperto do coração» (cf. São João Paulo II, Enc.
Redemptoris Mater, 17). É a noite da fé. Mas, só desta noite é que desponta a
aurora da ressurreição. Ao pé da cruz, Maria repensou nas palavras com que o
Anjo Lhe anunciara o seu Filho: «Será grande (…). O Senhor Deus vai dar-Lhe o
trono de seu pai David, reinará eternamente sobre a casa de Jacob e o seu
reinado não terá fim» (Lc 1, 32-33). No Gólgota, Maria depara-Se com o
desmentido total daquela promessa: o seu Filho agoniza numa cruz como um
malfeitor. Deste modo o triunfalismo,
destruído pela humilhação de Jesus, foi igualmente destruído no coração da Mãe;
ambos souberam calar.
Precedidos por Maria, incontáveis santos e santos seguiram a Jesus pelo
caminho da humildade e da obediência. Hoje, Dia Mundial da Juventude, quero
lembrar os inúmeros santos e santas jovens, especialmente os de «ao pé da
porta», que só Deus conhece e que às vezes gosta de no-los revelar de surpresa.
Queridos jovens, não vos envergonheis de manifestar o vosso entusiasmo por
Jesus, gritar que Ele vive, que é a vossa vida. Mas, ao mesmo tempo não tenhais
medo de O seguir pelo caminho da cruz. E, quando sentirdes que vos pede para
renunciardes a vós mesmos, para vos despojardes das próprias seguranças
confiando-vos completamente ao Pai que está nos céus, então alegrai-vos e
exultai! Encontrais-vos no caminho do Reino de Deus.
Aclamações
festosas e encarniçamento feroz
É impressionante o silêncio de Jesus na sua Paixão. Vence inclusivamente
a tentação de responder, de ser «mediático». Nos momentos de escuridão e grande
tribulação, é preciso ficar calado, ter a coragem de calar, contanto que seja
um calar manso e não rancoroso. A mansidão do silêncio far-nos-á aparecer ainda
mais frágeis, mais humilhados, e então o demónio ganha coragem e sai a
descoberto. Será necessário resistir-lhe em silêncio, «conservando a posição»,
mas com a mesma atitude de Jesus. Ele sabe que a guerra é entre Deus e o
príncipe deste mundo, e não se trata de empunhar a espada, mas de permanecer
calmo, firme na fé. É a hora de Deus. E, na hora em que Deus entra na batalha,
é preciso deixá-Lo agir.
O nosso lugar seguro será sob o manto da Santa Mãe de Deus. E enquanto
esperamos que o Senhor venha e acalme a tempestade (cf. Mc 4, 37-41), com o
nosso testemunho silencioso e orante, demos a nós mesmos e aos outros a «razão
da esperança que está em [nós]» (1 Ped 3, 15). Isto ajudar-nos-á a viver numa
santa tensão entre a memória das promessas, a realidade do encarniçamento
palpável na cruz e a esperança da ressurreição.