O descompasso ético-moral que
afeta fortemente a sociedade contemporânea explica também o fenômeno instigante
da adoção fácil de modismos de todo tipo. Já as atitudes que merecem servir de
modelo encontram resistências. Busca-se, a qualquer preço, conquistar certa
“originalidade”, aceitando, sem critérios, aquilo que é exótico. Assim, as
pessoas copiam gestos, atitudes e adotam traços de tribos urbanas para serem
aceitas em determinados grupos. E tudo o que aparenta ser “certinho demais” é
rechaçado.
A simetria e o perfeccionismo são considerados obsoletos e fora de propósito. Cada vez mais, o que vale é fugir de padrões. Algo que se faz, paradoxalmente, adotando modismos.
A simetria e o perfeccionismo são considerados obsoletos e fora de propósito. Cada vez mais, o que vale é fugir de padrões. Algo que se faz, paradoxalmente, adotando modismos.
A imitação, considerada “careta”
e fora de propósito, consolida-se, de modo contraditório, em atitudes e no uso
de objetos, roupas e gírias que têm força para promover a identificação com
grupos que estariam fora dos considerados “padrões convencionais”. Os modismos
contribuem muito para a formatação de identidades. Mais até do que princípios
éticos e morais, necessários para promover desenvolvimento qualificado da
cidadania. Isso, certamente, é também uma explicação para os procedimentos e
posturas condenáveis que têm minado os funcionamentos de muitos setores da
sociedade.
Esse fenômeno dos modismos tem,
incontestavelmente, relação com a emergência hegemônica da subjetividade. Cada
vez mais, os entendimentos, desejos e escolhas são definidos para atender
parâmetros e expectativas individuais, mesmo quando isso possa significar
prejuízo para os outros. O sentido social que faz o sujeito corrigir-se e
balizar suas posturas de modo a não ameaçar o bem comum, não ferir a dignidade
de outras pessoas, é gradativamente relativizado.
Assim proliferam comportamentos
que alimentam o desarvorado desejo de fazer valer a própria subjetividade,
mesmo que isso signifique gerar prejuízos para a coletividade. Vale tudo para
conquistar a própria satisfação: princípios inegociáveis deixam de ser o ponto
de partida para se alcançar metas. Fundamentos éticos e morais, quando
percebidos como obstáculos na busca da satisfação pessoal, são facilmente
relativizados. Desse modo, os sujeitos pautam suas escolhas e justificam
atitudes alegando que têm o direito de fazer o que lhes convêm e lhes é mais
prazeroso. Essa postura egoísta é camuflada em diferentes modismos, que ganham
espaço facilmente talvez por sua pretensa característica de protesto, além da
capacidade para alimentar o gosto pelo que desperta curiosidade, por ser
inusitado.
Esse fenômeno torna-se grave
quando se considera algumas de suas consequências: o quase não percebido
processo de despersonalização, a séria supervalorização de indivíduos em
relação ao coletivo e a adoção inadequada de práticas que tomam lugar de
valores culturais importantes para os funcionamentos da sociedade. Obviamente,
modismos não são avanços nas indispensáveis atualizações exigidas pelo mundo
contemporâneo.
Mais importante do que a simples
assimilação de certos padrões nos modos de ser e de agir, a partir de
exacerbações da subjetividade, está a necessidade de superar preconceitos e
adotar práticas alicerçadas em valores inegociáveis. Pensa-se muitas vezes que
imitar algo, mesmo que seja bom, possa representar falta de originalidade. A
subjetividade humana contemporânea se seduz muito facilmente pela presunção de
ser referência única e inigualável. Por isso, muitos ridicularizam o uso de
gestos e práticas, simples ou mais significativos, já vividos por outros.
Classificam essa postura como “pobreza na criatividade”. Essas pessoas,
normalmente, se enxergam como o ponto de referência no contexto social. Por
isso, cometem um equívoco, pois imitar quem se dedica à bondade e espelhar-se
nas pessoas que são referência no que fazem de importante para o
desenvolvimento social são atitudes que fortalecem a cultura do bem.
Os modismos são fugazes. Mas
imitar quem se dedica às boas ações e aos valores inegociáveis é contribuir
para que toda a sociedade supere situações críticas, provocadas justamente pela
falta de condutas éticas. A coragem de inspirar-se em quem promove o bem pode
fazer crescer o apreço por imitações que farão muitos, idealmente todos, a
repetir, despretensiosamente, gestos, ações e posturas orientadas pela bondade,
o que garante o crescimento humano nos trilhos da verdade e da justiça.
Paulo apóstolo, consciente de sua
tarefa e à luz da sua responsabilidade missionária, não deixou de convidar seus
interlocutores a serem seus imitadores. Imitar quem faz o bem é um investimento
que garantirá ao conjunto da sociedade a confecção de um novo e consistente
tecido cultural, ancorado na bondade e na verdade que sustentam a justiça.
Menos modismos, mais imitações de quem faz bem o bem.
Por
Dom Walmor Oliveira de Azevedo – Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte