Quando iniciei o meu trabalho como diretor
espiritual do seminário menor nos idos de 1993, ficou também sob a minha
incumbência algumas aulas de formação para os futuros candidatos ao ministério
sacerdotal. Além da formação litúrgica, passei a apresentar algumas formações
sobre a devoção Mariana. Essa sempre esteve presente no modo em que fui
introduzido na fé no meio familiar. O tempo do seminário reforçou ainda mais
esse meu olhar para Maria e a compreensão do seu ministério no grande mistério
salvífico. A devoção diária do terço foi criando um hábito meditativo em meio
às distrações da mente que me vinham com bastante frequência.
Na época cheguei a elaborar uma apostila que tinha
o título que estou dando a esses artigos. É de uma canção do Pe. Zezinho, que
sempre reservou em suas composições um especial espaço para Maria, compondo
pequenas peças mistas de teologia mariana carregada de profunda e poética
espiritualidade. Essas canções também ‘embalaram’ a minha fé. Esse Ano Mariano,
que celebra os trezentos anos da aparição da imagem de Aparecida e os cem anos
da aparição da virgem de Fátima, merece a retomada e o empenho de voltar a
escrever sobre Maria.
Como muito já se disse ou escreveu, mas “sobre
Maria nunca se dirá o bastante” (Sto. Afonso Maria Monfort), me coloco também
na esteira daqueles que tentam ajudar outros na compreensão e no valor da
devoção mariana. Tenham um pouco de paciência na frequência os textos, pois
necessito conferir o que escrevo com outros autores, além do magistério da
Igreja, para dar fundamento ao texto. Darei as devidas citações aos seus
autores e ao mesmo tempo darei alinhamento aos vários pensamentos aqui
partilhados. Pode ser que haja repetição de ideias por distração ou para reforçar
algum pensamento.
O Pe. André Moffatt, ss (Sociedade de são Sulpício)
foi meu professor de Mariologia no Seminário Maior Nossa Senhora de Fátima, em
Brasília. Dele tomo algumas linhas de reflexão. Meu agradecimento pela clareza
e síntese de pensamento.
Falar de Maria traz consigo certa facilidade, pois
ela está presente de um modo particular tanto na Igreja católica quanto
Ortodoxa. Pelo forte apelo popular que a devoção mariana tem alcançado e
‘forçado’ a reflexão da própria Igreja. Mas acima de tudo isso está o seu papel
na história da salvação. Ela é mãe de Deus e nossa mãe por consequência de
nossa comunhão com o Filho ao nos chamar de irmãos. O sentimento materno-filial
ganhou proporções grandiosas, visceral.
Mas é claro que a maior dificuldade é compor uma
reflexão de um modo teológico certo, sem exageros e sentimentalismos, dando-lhe
o verdadeiro sentido e colocando-lhe no devido lugar. A maternidade de Maria,
ponto primeiro de nossa reflexão e de onde emana toda sua virtuosidade, encontra
um obstáculo na sociedade atual que já não valoriza tanto a maternidade
(aborto, mães solteiras e desassistidas etc.). Sem falar de que a virgindade,
tanto masculina como feminina, não encontra mais valor em nossa sociedade
diante do liberalismo sexual. Maria é virgem por uma opção pessoal e Mãe por
uma graça de Deus. O contexto ecumênico torna também difícil tratar de Maria
dado ao cristocentrismo e a mediação única de Cristo. A tendência é omitir a
pessoa de Maria nos diálogos que tentamos travar.
Gosto muito de trata-la como a Virgem, mesmo
compreendendo o valor de sua consagração, o que me leva a dar-lhe esse nome é o
seu coração todo voltado para Deus, onde outros elementos não encontram tanta
importância.
Está aberta a temporada de reflexões marianas. Um
leque de possibilidades desponta a nossa frente. Vamos juntos nesse caminho.
Ela mesma se faz companheira de caminhada e nos ilumina com a própria luz que
ela recebe do Filho. Que essa partilha nos ajude a crer melhor, a rezar e a
esperar com a mesma confiança que essa primeira cristã soube viver a sua fé.
Pe. João Bosco Vieira Leite